Um país que tem milhões de
crianças jogando futebol, clubes com dinheiro, estrutura e boa condição social.
Tudo isso poderia ser motivo para que os Estados Unidos formassem muitos
jogadores de futebol, mas não é.
Sem uma categoria de base bem
constituída nos clubes, a aposta do futebol é no atleta universitário. E a
National Collegiate Athletic Association (NCAA) é a liga que coordena o cenário
esportivo universitário em todas as modalidades.
Muitos atletas são observados
pelos clubes na NCAA e acabam escolhidos pelo Draft, a seleção de novos
jogadores por parte dos clubes, nos mesmos moldes da NBA e NFL. Na
universidade, inclusive, o futebol feminino é mais forte que o masculino.
Na esperança de tornar a MLS
(Major League Soccer) uma das ligas mais competitivas do mundo, os Estados
Unidos têm investido nas escolinhas de futebol e no esporte universitário. O
público nos estádios e o interesse pela TV também aumentaram pela modalidade e
há um planejamento para que a MLS alcance reconhecimento mundial até 2022.
Neste bate bola concedido por
email diretamente dos Estados Unidos, o treinador Fernando Novaes que é de
Fortaleza (CE) vem brilhando na terra do Tio Sam e vamos conhecer um pouco de
sua história de superação e conquistas onde ele fala sobre a importância dos
treinadores e jogadores estrangeiros no processo de profissionalização do
futebol universitário e profissional nos EUA.
BATE BOLA COM FERNANDO NOVAES
Fale um pouco sobre sua
formação acadêmica e o início de sua trajetória no futebol.
Sou formado em Educação física
desde 2013 pela Unifor. Hoje faço curso de treinador da AFA, que me dará
direito de trabalhar na Europa como treinador.
Antes de ser treinador de
futebol eu era preparador fisco de atletas, mas minha paixão era o futebol e em
2016 recebi uma oferta de trabalho como treinador em uma academia de futebol de
Fortaleza e resolvi aceitar. Com um ano um amigo me falou sobre um curso de
treinador no Rio de Janeiro, disse que os destaques eram convidados a trabalhar
por um período nos EUA. Então resolvi fazer o curso e me fui convidado para
passar 2 meses trabalhando nos EUA durante o Verão de 2017. A empresa gostou do
meu trabalho e me convidou para passar mais 2 meses no Outono.
Nesse mesmo Outono de 2017 fui
convidado para ser o preparador físico da seleção brasileira de Minifootball na
copa do mundo, na Tunísia. Apesar de toda minha vontade de estar com a seleção,
não pude aceitar o convite, pois tinha contrato com uma empresa americana e eles
não me liberaram e resolvi não quebrar o contrato, já que eles tinham me aberto
as portas nos EUA.
Mas em 2018 fui novamente
convidado para a seleção, mas agora para ser treinador assistente da sub-20 e
preparador físico da principal. Passei um tempo representando a seleção, mas
com a saída do treinador, eu também me desliguei da comissão.
Hoje sou treinador do sub-18
do LSA National Team e sou auxiliar técnico do LSA PRO.
Como surgiu a ideia de
investir no mercado esportivo?
Quando comecei a trabalhar
nessa academia de futebol, que visava mandar jogadores para estudar e jogar e
estudar nos EUA vi uma possibilidade de fazer algo no mesmo segmento, porém de
uma forma mais objetiva e que pudesse ajudar os atletas verdadeiramente.
Como é a formação do treinador
de futebol nos Estados Unidos?
Aqui nos EUA existem algumas
confederações e cada confederação tem seus próprios cursos para você poder
fazer e atuar como treinador, mas aqui nos EUA só o futebol precisa de licença
para trabalhar como treinador, nenhum outro esporte necessita.
De que maneira você avalia a
evolução do futebol nos Estados Unidos e que importância têm os treinadores e
jogadores estrangeiros nesse processo de profissionalização?
Quando se fala em estrutura
não se pode reclamar, aqui eles têm parques com diversos campos. Joguei um
final de semana com minha equipe em uma cidade que tinha um parque com 22
campos de futebol. É algo surreal, porém aqui o futebol não é o principal
esporte que eles praticam, não é o esporte que eles dão prioridade.
Então creio que esse é um dos
motivos que o futebol aqui não evolui tanto quanto outros esportes, porém o
número de estrangeiros é muito grande, principalmente latinos americanos e
esses gostam muito do futebol e com isso está aumentando a competitividade e
melhorando a capacidade de tomada de decisão do atleta americano. Creio que
essa convivência e troca de experiência é algo benéfico para que o futebol nos
EUA possa evoluir.
Como é estruturado o futebol
nos Estados Unidos? Há uma diferenciação muito grande entre a categoria
profissional e as categorias de base?
Aqui o forte não é a categoria
de base, mas sim as universidades, são lá onde eles realmente investem. Os
melhores atletas ganham bolsas esportivas e tem que estudar e tirar boas notas
também, se não está fora do time ou perde a bolsa. Eles priorizam muito o
desenvolvimento do atleta não só para o esporte, mas para o mundo, sabem que a
maioria não vai conseguir se tornar profissional, porém a maioria vai se dar
bem futuramente em outras áreas.
E por algum tempo me perguntei
se isso poderia funcionar. E a resposta é sim. Basta analisar nas olimpíadas,
normalmente os EUA estão entre os primeiros colocados no quadro de medalhas e a
maioria dos atletas são universitários ou são formados.
Isso se dar pelo
desenvolvimento cognitivo do atleta, é algo que o brasileiro não entende.
Quanto melhor o grau cognitivo do meu atleta, mais fácil dele entender a tarefa
e resolver as situações que vão aparecer para ele durante os jogos.
Qual é o perfil atual do
jogador de futebol nos Estados Unidos?
São jogadores bem
disciplinados taticamente, porém sem o 1x1 que os brasileiros têm, sem a
“malandragem”. Mas normalmente são jogadores muito bem taticamente.
Como é o mercado de trabalho
para profissionais do futebol brasileiro que queiram trabalhar nos EUA? Quais
são os principais desafios e dificuldades a serem superados?
A grande questão é: o que você
está disposta a largar para tentar algo novo nos EUA?
Não é fácil trabalhar como
treinador aqui porque você tem que ter permissão para poder trabalhar se não
fica tudo mais difícil ainda, esse é o principal desafio. Quando vim à primeira
vez larguei muita coisa no Brasil para poder ter essa experiência. Fiz um curso
de treinador, me destaquei no curso e me convidaram para passar um tempo aqui.
Assim começou tudo nos EUA.
Desde esse dia fui buscando oportunidades para chegar ao meu objetivo. Era uma
experiência de apenas 2 meses, mas mesmo assim larguei uma empresa onde eu era
cotado para ser o coordenador, deixei para trás amigos, família, etc.
E viajei para passar esses 2
meses trabalhando no Verão como experiência. Depois desses 2 meses fui
convidado para o Outono e então passei mais 2 meses nos EUA. E assim tudo
começou.
Mas, a maioria das pessoas não
estão dispostas a pagarem o preço para tentar um sonho. Hoje estou colhendo
muita coisa de escolhas que fiz no passado e continuo plantando para chegar
onde realmente sonho.
O que é o treinamento mental
avançado Pré-Competição?
O treinamento mental é um
trabalho onde tem o objetivo de o atleta poder se conhecer melhor e criar
objetivos para poder melhorar seu desempenho na competição. Onde ele possa
entrar no estado de flow, que é o nosso principal objetivo com o atleta.
Mas confesso que não trabalho
muito com atletas separadamente, fiz o curso de treinador mental para poder
melhorar como treinador, pois percebi que a grande diferença entre os grandes
treinadores não é a apenas a parte tática, mas saber lidar com cada atleta de
modo especifico.
Cada um vai ter um modo
especifico de se trabalhar. Alguns atletas reagem bem a pressão, outros não,
alguns atletas reagem melhor a conversas individuais e outros você pode cobrar
na frente do grupo. É função do treinador saber lidar com cada personalidade.
Quais as diferenças na
metodologia do treinador americano para o treinador brasileiro?
Os treinadores americanos são
muito físicos. Eles gostam de atletas fortes e com boa capacidade física. Os
treinamentos muitas vezes são mais voltados para esse lado do que propriamente
o futebol, a tomada de decisão do atleta, a criatividade, etc.